Olhares
(Imagem retirada daqui)
Hoje fui com a minha mãe a um dos Hospitais aqui da zona de Lisboa e enquanto eu andava com ela de um lado para o outro não pude deixar de reparar num casal que também por ali andava na mesma lide, talvez da idade dos meus pais. Percebi desde logo que a mente dele estava afectada. O senhor trazia consigo dois sacos de plástico que supostamente continham "papéis importantes que podiam ser precisos". Disse a um dos enfermeiros que trazia ele os sacos porque "ela nunca gostou de andar com sacos". "Toda a minha vida carreguei sacos", defendeu-se ela. E mais tarde ouvi-o comentar para o lado: "Cinquenta e um anos de suplício a aturar isto! Esta mulher levou-me a minha cabeça e levou-me os meus olhos..." Não pude deixar de sentir pena da senhora. As doenças mentais são desgastantes. Deduzo que esta senhora trate do marido o melhor que sabe e pode. A idade também nela já ia avançada e acredito que não seja fácil lidar com o aparente mau feitio do senhor. A tristeza que vi naquele rosto. A pressa em chegar ao aconchego de casa que lhe senti no andar. A autoridade com que lhe agarrava a manga do casaco por ele se recusar a dar-lhe a mão. Percebi-lhe no respirar uma urgência que me é tão familiar e entendi-a também como minha, porque só quem lida com estas doenças consegue entender esta revolta e ler estes sinais. Cuidar é tudo menos fácil.